sábado, 19 de setembro de 2009

Estudos sobre dor crônica geralmente têm pequena duração. Na prática, pacientes são mantidos com medicamentos durante anos.

Enquanto eu refletia sobre minhas opções de pós-graduação após a faculdade de medicina, dividi as especialidades médicas nas mais prazerosas (parabéns, é uma menina saudável!), mais cruéis, como oncologia (melhor deixar suas coisas em ordem) e "sem rosto", como patologia (na qual as notícias boas e ruins são entregues através de um relatório impessoal).

Reconheci que não tinha o necessário para ser cruel. Por gostar tanto de lidar com pessoas, a especialidade "sem rosto" também estava descartada. Caí na medicina da administração da dor por acaso e, surpreendentemente, descobri que ela se encaixa na categoria das especialidades prazerosas: existem poucas sensações melhores do que aliviar o sofrimento de um paciente.

Mesmo assim, fiquei pensando no que é pior: informar às pessoas que elas vão morrer, ou que elas provavelmente passarão o resto de suas vidas com dor.

Acompanho um paciente mais velho há cinco anos. Ele é um senhor amável de 80 e poucos anos com dores crônicas nas costas e nas pernas. Com os anos, passamos por sucessivas tentativas com diferentes medicações e tratamentos. Apesar de nossos melhores esforços, ele continua a sofrer de dor crônica moderadamente severa.

Meu paciente e sua família costumeiramente chegam cedo para as consultas, sempre extremamente educados, sempre obedecendo às recomendações do tratamento.


O fato de que ele nunca é exigente, apenas agradecido, só torna as coisas ainda mais difíceis quando meus esforços fracassam.



Há também os jovens veteranos, frequentemente na casa dos 20 e poucos anos, recém-chegados do combate. A dor crônica é muitas vezes complicada por danos cerebrais traumáticos, distúrbio de estresse pós-traumático não tratado, e distúrbios de sono e humor.


O desafio é encontrar um equilíbrio entre o alívio da dor e os efeitos colaterais; garantir que analgésicos opióides como Percocet e Vicodin sejam usados para tratar a dor, não o humor ou o sono. Eu me encontro na posição pouco invejável de limitar o acesso a medicamentos para a dor se seu uso pode levar a um declínio funcional.


Pequena duração
A American Pain Society e a American Academy of Pain Medicine publicaram recentemente em conjunto as Diretrizes de Tratamento com Opióides. Elas incluem alguns fatos preocupantes – por exemplo, que quase todos os testes de alta qualidade que avaliam o valor dos opióides para dor crônica não-associada ao câncer eram estudos de eficácia a curto prazo, com 16 semanas ou menos de duração.

Na prática clínica, os pacientes são muitas vezes mantidos nos opióides por vários anos ou décadas.

Além disso, os estudos geralmente excluem pacientes com riscos maiores de abuso de substâncias ou com problemas médicos ou psiquiátricos significativos coexistentes; isso também é irreal na prática clínica.

Testes sugerem que, em média, os pacientes que recebem opióides apresentam uma melhora de apenas 2-3 pontos, numa escala de dor de 0 a 10. Os efeitos colaterais e os riscos são muitos: constipação crônica, sedação e sonolência, piora no humor, hiperalgesia induzida pelo opióide (um fenômeno paradoxal, no qual os medicamentos para a dor acabam aumentando a dor), hipogonadismo (função endócrina prejudicada) e dependência.

Outro impacto veio num artigo publicado no "The Journal of the American Board of Family Medicine". O título – "Overtreating Chronic Back Pain: Time to Back Off?" – e a introdução já diz tudo: "A inovação muitas vezes tem superado a ciência clínica, deixando incertezas sobre a eficácia e a segurança de muitos tratamentos comuns. Complicações e até mortes relacionadas à administração da dor estão aumentando".

A espiral negativa, escrevem os autores, começa com exames de imagens inadequados, que podem revelar descobertas irrelevantes e incidentais capazes de levar a tratamentos desnecessários. Em consonância com as novas diretrizes, os autores pedem o uso mais prudente de opióides para tratar dor crônica na região lombar. Eles defendem uma seleção mais cuidadosa de candidatos a injeções e cirurgias de coluna, apontando que essas intervenções podem, na verdade, piorar a situação.

"Primeiro, não cause dano" é o princípio básico que aprendemos na faculdade de medicina. Porém, uma não é ensinada a habilidade de dizer: "Não há mais nada que eu possa oferecer a você". Aprendi que minha especialidade, como todas as outras, tem suas limitações. Aprendi a não levar essas limitações para o lado pessoal: elas não são o reflexo da minha incompetência, mas simplesmente o estado atual da ciência (o domínio disso é o ponto onde a ciência vira arte).

Também aprendi que é importante que primeiro eu aceite essas lacunas terapêuticas, para que eu possa transmitir expectativas realísticas de forma eficaz, não perpetuar o mito médico. Finalmente, fiquei mais confortável com duas das palavras mais difíceis do vocabulário de um médico: "suficiente" e "não".



Fonte : http://dicasgratisnanet.blogspot.com/



Fonte : http://dicasgratisnanet.blogspot.com/

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